DOM LUIZ
CAPPIO
O bispo guerreiro
contra a transposição
da maldade
Autor:
Rosalvo Martins Júnior
Brotas de Macaúbas - Bahia
Vou
pedir a proteção
Da santa Virgem Maria
Pra contar para vocês
A história da magia
De um bispo arretado
Homem culto e letrado
Que tem aqui na Bahia
Ele luta pelo povo
É contra a transposição
Das águas do Velho Chico
Pra ele coisa do cão
História que vou relatar
Para todos proclamar
É só prestar atenção
Foi numa greve de fome
Uma é história de verdade
Que o bispo se transformou
Para toda a eternidade
No grande bispo guerreiro
Justo, bravo e altaneiro
Contra a transposição da maldade
Ele nasceu em São Paulo
Lá em Guaratinguetá
Veio para o São Francisco
O povo evangelizar
Desde que usava sandálias
Carregando poucas tralhas
Como frei a proclamar
Dom Luiz
Flávio Cappio
Assim ele foi batizado
Na fé em Cristo Jesus
E nunca mudou de lado
Sempre junto com a fé
Com Maria e com José
E Jesus crucificado
Ele é filho de
imigrantes
De origem italiana
Mas se fez frei
consagrado
Pela ordem franciscana
Onde frei Luiz se
destaca
Feito ouro, feito prata
Vejam que coisa bacana
Jovem rapaz estudado
Formou-se em economia
Mas queria ser
engenheiro
E estudou com alegria
Em seminário do Rio
Petrópolis terra de frio
Concluiu Teologia
Após sua ordenação
Foi para a Periferia
Da cidade de São Paulo
Antes de vir pra Bahia
Na Pastoral Operária
Aprendendo coisa rara
Se destacou dia a dia
Veio com a roupa do
corpo
Para pregar no Nordeste
Isso tudo aconteceu
Nos anos setenta e sete
E no sertão nordestino
Ele se fez peregrino
Por isso faz e acontece
No Nordeste frei Luis
Descobriu coisa bacana
Que apesar da pobreza
Essa gente soberana
Cultiva a fé e a esperança
Velho, jovem e criança
Profunda riqueza humana
Uma forte ligação
Ele tem com São
Francisco
Por isso veio parar
À beira do Velho Chico
Onde o povo o considera
E nunca fica na espera
Pelo trabalho bonito
Para ele o Velho Chico
Imita o santo do seu nome
Nasce rico e dá aos pobres
Matando a sede e a fome
É o pai e a mãe de todos
Não deixa ninguém bobo
Sejam mulheres ou homens
Sempre diz que se o rio é vivo
Bem para o povo há de ser
Mas se doente ou se morto
Fará toda gente sofrer
Por isso a luta incessante
Convoca a todo instante
Para o rio socorrer
Ao fazer 48 anos
Fez uma peregrinação
Da nascente à foz do rio
Prestando muita atenção
Em todos os seus problemas
Desde o maior aos pequenos
Numa ecológica missão
Falando a linguagem simples
Como se identifica o povo
Disse que o rio é presente
De Deus e nunca um estorvo
E a missão coletiva
Sem descanso, sem guarida
É preservar, isso é novo
Plantou um milhão de árvores
Nesse grande desafio
Dando exemplos concretos
E não deixando o vazio
Criando novos guardiões
Cidadãos e cidadãos
Os defensores do rio
A experiência ecológica
Logo lhe trouxe um norte
Ele escreveu grande livro
Que fala de vida e morte
Desse rio importante
Que está a todo instante
Entregue à própria sorte
Iniciou grande luta
Com missão religiosa
Mostrando pra toda gente
Idéia maravilhosa
Pois precisa preservar
E nunca mais depredar
Essa joia preciosa
Tornou-se bispo da Barra
Importante diocese
Aumentando a sua ação
Trabalho de catequese
Foi setenta e sete ano
Que num gesto tão humano
Ele assumiu essa messe
Como bispo teve voz
Pra denunciar o estrago
Que fizeram contra um rio
Que corta todo nosso estado
E contra a transposição
Sem disse um grande não
Postou-se do nosso lado
Fez uma greve de fome
Para chamar a atenção
Contra a agonia do rio
Que não pode morrer não
Mas isso pode acontecer
E todo mundo vai ver
Com essa transposição
É que o governo pretende
Fazer o que já foi dito
Tirando a água do rio
Só para fazer bonito
Nesse sertão tão esguio
Onde não se sente frio
Mas isso é muito esquisito
Em sua greve de fome
Desafiou até Lula
Ex-presidente que o povo
Idolatra e não anula
Mas o bispo deu seu recado
Sua queixa, o seu lado
Sua opinião, sua bula
Com o presidente Lula
Ele falou mais de uma vez
Expondo seus argumentos
E explicando o que fez
Na luta pela defesa
Dessa nossa grande riqueza
Do rio com altivez
Mesmo contra o presidente
Que ele até deu apoio
Dom Luiz teve a seu lado
Grande reforço do povo
Em sua greve de fome
Ele não citou o nome
Mas denunciou o estorvo
A greve foi interropida
Após selado o acordo
Com ministro Jaques Wagner
Que hoje governa o povo
E como nada foi feito
Muita falta de respeito
À greve voltou de novo
A decisão federal
De fazer a transposição
Com ajuda do Exército
Ao bispo agradou não
Ele retomou o protesto
E com esse nobre gesto
Nem comeu mais o feijão
A nova greve de fome
Não foi gesto solitário
Pois teve o apoio de todos
De artista e de operário
Dom Luiz mais uma vez
Reagiu com altivez
Se fez líder libertário
Os movimentos sociais
Mostraram que têm valor
Apoiando o religioso
Nesse seu novo labor
Mas o governo federal
Sem querer falar de mal
Nem mesmo assim recuou
A greve de fome pra ele
Foi experiência divina
De que a morte é passagem
E não o fim, uma sina
Pois é morrendo que se nasce
Na vida eterna renasce
Não é coisa pequenina
Gastaram muitos milhões
Pra sangrar o Velho Chico
Gritaram aos quatro ventos
Que era o que tava escrito
Mas tá tudo lá abandonado
Sem nenhum bom resultado
Isso eu não acho bonito
Dom Luiz denunciou
Que essa transposição
Era dinheiro perdido
Não faz bem para a nação
Nem a esse povo sofrido
Nesse labor tão doído
Pois somos todos irmãos
A luta de dom Luiz
Que o governo não deu trela
Teve o apoio do céu,
De frei Boff e Sabatela
Elba Ramalho e Esquivel
Nós fizemos escarcéu
Em bairro chique e favela
Após um mês de jejum
Mas com muita oração
Dom Luiz foi internado
Ao lado de seus irmãos
Que unidos protestavam
E a todos proclamavam
Contra a tal transposição
Muito fraco e deprimido
Celebrou sua missão
36 anos de sacerdócio
Junto ao povo do sertão
Finda a greve de fome
Mas o povo pouco come
E a luta acaba não
A vida de Dom Luiz
Esse bispo pobrezinho
Está virando cordel
E sonho do ribeirinho
De que o rio melhore
Mais piscoso se transforme
E não definha aos tiquinho
Queremos que o povo pense
Nesse momento estanque
Que a causa ecológica
É uma luta gigante
Pela vida e contra a morte
Contra o azar pela sorte
Desse rio importante
Durante a greve de fome
Desse líder ribeirinho
Ele respondeu aos bispos
Como muito jeito e carinho
Quando a razão se estingue
Mesmo que ela respingue
A loucura é o caminho
Dom Luiz seguiu para a Barra
Pregando contra a injustiça
Clamando atenção do mundo
Numa luta sem preguiça
É contra a transposição
Não arredou posição
Não vai deixar essa liça
Esse seu grito ecoou
Pelos prados e gerais
De todo canto do mundo
E o prêmio pela paz
Em Bruxelas recebeu
Reconhecimento mreceu
Da Christi Internacional
Foi na Romaria das Águas
Pros lados de Sobradinho
Que o prêmio foi entregue
A esse heroi ribeirinho
Seguidor de São Francisco
Dos santos o mais bonito
E também mais pobrezinho
Depois do prêmio da paz
Prestem muita ação
Veio a Fundação Kant
Que é do povo alemão
Premiar a Dom Luiz
Que a Deus sempre bemdiz
E que do mundo é cidadão
Do Brasil com todo mérito
A esse padre impoluto
Que se fez frei franciscano
E que é bispo muito justo
Ganhou com mérito e louvor
Pois ouviu-se o seu clamor
O Troféu João Canuto
E o dinheiro do prêmio
Ele aplicou com lisura
E um memorial aos mártires
Ele controi com bravura
Pra que jamais se esqueça
E que ninguém esmoreça
Na luta contra a ditadura
O bispo hoje é respeitado
Por ser pessoa bacana
Fiel devoto de Cristo
Com a força franciscana
De Ipupiara a Morpará
Barra e Guaratinguetá
Da Brotas a Ibotirama
Aqui termino meus versos
Muito feliz comovido
Por ter conhecido Dom Luiz
Esse bispo destemido
Que sem nunca recuar
Ainda muito ainda fará
Por nosso povo sofrido
Para Dom
Luiz, o Velho Chico
Imita o santo do seu nome, pois nasce rico e dá aos pobres
* Este cordel está publicado na Antologia dos Cordelistas do Território do Velho Chico
Nenhum comentário:
Postar um comentário